Diariamente somos submetidos a um bombardeio de más notícias. A desgraça dá audiência. O país tampouco ajuda: a violência, os escândalos, a bandalheira, as tragédias construídas pela imperícia, omissão ou negligência fazem parte da nossa conturbada rotina. Mesmo em noticiários comedidos, o percentual de tempo dedicado a temas negativos é significativamente maior que o conteúdo mais neutro ou otimista.
Pregar uma postura ´poliana´ diante desse quadro dantesco que nos é exposto diariamente é no mínimo inocente. É impossível ignorar a realidade, uma vez que a sua insistente repetição consome gradualmente nossa esperança. O brasileiro não é o povo mais feliz do mundo, e sim o mais otimista, o mais esperançoso de um futuro melhor. Até há pouco tempo, esse otimismo era reverberado pelos resultados econômicos que sinalizavam que o país finalmente se aprumava para materializar a promessa do futuro promissor que finalmente chegaria após séculos de espera. Infelizmente, a breve euforia de que estávamos diante da nossa ‘Canãa’ esfarelou-se em anos seguidos de ´quase-estaganação´ e cá estamos, todos nós, à espera de mudanças que possam enfim proporcionar um reajuste de rota que recupere a robustez de nossa esperança, maltratada diariamente pelo dia a dia. Sim, por que mudança é a palavra-chave nesse período de pré-campanha eleitoral, onde tanto governo quanto oposição se confrontarão para convencer quem é o mais capaz de promovê-la. E se precisamos mudar é por que algo vai mal ou ficou velho. Ou ambos.
A mobilidade social e o incremento na renda, fenômenos que se consolidaram ao longo dos últimos 20 anos e mais fortemente na primeira década desse século, proporcionaram a algumas centenas de milhares de brasileiros a oportunidade de experimentar situações até então inéditas, dentre as quais a primeira viagem ao exterior é um dos símbolos. Para os que já estavam acostumados, aumentou a frequência. Nunca tantos conterrâneos pisaram em solo americano ou europeu. E o contato com uma realidade distinta da que vivemos aqui, ainda que brevemente e em período de férias, tornou as comparações inevitáveis, normalmente desvantajosas ao Brasil. Nunca ouviram-se tantas lamentações e afirmações de desencanto do tipo ‘se pudesse, largava tudo’. Nunca tantos planejaram partir, mesmo que esse objetivo seja uma luz distante e quase ínfima na abóboda celeste.
Párias, traidores da pátria, que ousam cogitar trocá-la por solo estrangeiro? Longe disso. Os embates do cotidiano não tem nacionalidade. O desejo de melhor qualidade de vida transcende os vínculos de cidadania, que no limite pode ser exercida em qualquer lugar. ‘Seja o agente da própria mudança’, dizem com veemência aqueles que ainda convivem com a esperança ou iludem-se com efêmeros sinais de fumaça. Como?
Que poder de mudança tem um cidadão comum, cuja semana é consumida na maior parte do tempo por dezenas de horas no trabalho, perdido na ineficiência da imobilidade urbana das grandes metrópoles, convertido em cínico pela banalização das más notícias?
O desafio é tornar o micro-ambiente no qual você vive e exerce alguma influência na antítese da geralmente lamentável realidade nacional. Demonstrar, através do exemplo, de que é possível estabelecer referências de comportamento digno. Buscar inspiração ao nosso redor. Ela está por aí, trafegando anônima pela multidão, quase sempre ignorada pela mídia fornecedora de desgraças. Proteger-se contra a lamentação. Procurar boas notícias. Endurecer sem perder a ternura. Buscar luz na escuridão. Quem sabe um dia a somatória de boas práticas individuais supere a falta de civilidade coletiva e o Brasil possa enfim materializar a promessa de que o futuro está logo ali, paciente e com um sorriso a nos esperar.
Relacionado
Victor Loyola
Os textos refletem minha opinião pessoal sobre qualquer assunto, não há nenhum tipo de vinculo com corporações, grupos, ou comunidades. Comentários são extremamente bem-vindos. Me esforçarei ao máximo para fazê-lo um hobby permanente. No segundo tempo de minha vida, está definido que continuarei escrevendo. Se eu parar, de repente é por que eu surtei ou houve algum apagão de criatividade. Essa versão do blog está turbinada – é para ser mais agradável e acessível ao leitor. Há até um espaço para enquetes, uma maneira bem-humorada para encarar o mundo. Boa leitura!!!!!
2 Comentários
Marcia
13 de maio de 2014 em 07:43Aposto na somatória das boas práticas individuais, transformando o micro-ambiente! Leva tempo….será que vai dar tempo?! Há um lidar constante com a infelicidade, talvez, implantada ou mal cuidada…..leva tempo!
André França
19 de maio de 2014 em 11:21Estamos cada vez mais expostos as más noticias e propícios a alimentar as lamentações. Cabe a nós mesmos disseminar o que ainda há de bom e útil acontecendo ao nosso redor, encorajando os mais abatidos e pessimistas de que existem pedras e obstáculos, mas também existem grandes caminhos verdes e nivelados.