O difícil desafio de parar no auge

Hoje consegui terminar a sexta temporada de Vikings, que espero ter sido a última, e o fiz quase por obrigação. Como usual na maioria das séries, ela começou a ficar excessivamente chata e arrastada a partir da terceira ou quarta, após a morte do seu protagonista maior, Ragnar Lothbroke. É quase lugar comum dizer que as séries perdem o vigor a partir de um determinado momento, mas permanecem sendo produzidas por razões comercias, por mais que a qualidade do produto não seja a mesma.

Há exceções e certamente você saberá listar algumas, como ‘Game of Thrones (7 temporadas) e Suits (8 temporadas), que foram finalizadas no tempo certo. Poderíamos dizer que pararam no auge.

Essa situação de saber quando parar é um grande desafio em nossas vidas profissionais e até pessoais. O exemplo das séries pode facilmente ser transposto para nosso cotidiano.

A analogia com atletas de alta performance é a primeira que vem à cabeça. Não raro, eles passam do ponto e permanecem em atividade em plena “descendente”, ofuscando um pouco o brilho do apogeu em seu passado recente. Talvez por não saber fazer outra coisa ou pela adrenalina do ambiente competitivo, muitos simplesmente não sabem parar na hora certa. Raros são os casos como um Pelé, que retirou-se da seleção logo após o tricampeonato e foi jogar em Nova Iorque, em uma liga incipiente e pouco competitiva, ou um Usain Bolt, maior velocista da história, que parou no auge, imbatível.

Temos casos de mitos que insistiram em continuar, desafiando o tempo, que implacável, mostrou que sempre prevalece. Foi o caso de Michael Jordan, que após sair do Bullz, não teve o mesmo brilho no Washington Wizards, ou de Michael Schumacher, que após um período fora das pistas, retornou à F1 para não subir nenhuma vez no pódio. Exemplos não faltam.

Assim como no esporte, o mesmo acontece na vida profissional. Há o tempo de amadurecimento, apogeu e declínio quando nos dedicamos à mesma atividade. É praticante impossível mantermos o nível de desempenho, foco, energia por muito tempo seguido. Sua extensão depende muito da complexidade da função, mas eu diria que mesmo naquelas mais desafiadoras, dificilmente deveríamos ter um ciclo maior que cinco anos, certamente menor que isso no caso de atividades mais simples.

Claro que na vida profissional, diferentemente do que ocorre com um atleta de alta performance, podemos nos reinventar, fazer outra coisa, mudar. Essa decisão também é dificil. Em algumas ocasiões eu presenciei excelentes profissionais “passarem do ponto”, permanecendo em suas funções por comodidade, orgulho ou simplesmente preguiça de recomeçar, mesmo com a curva de desempenho visivelmente na descendente. É o que podemos chamar de ‘tocar a bola de lado, esperando o árbitro apitar’. E se não tomamos a decisão, cedo ou tarde as circunstâncias se encarregarão de fazê-lo.

Saber quando parar ou a hora de mudar e arriscar-se em outras jornadas é uma atitude extremamente difícil, principalmente quando você está cercado de êxitos recentes naquilo que faz. Porém, uma vez tomada a decisão, é bem provável que a sensação revigorante de frio na barriga lhe traga de volta a energia e o entusiasmo que gradualmente se esvaem com a rotina.

Determinar o fim do seu próprio ciclo e começar outro é para poucos. Normalmente as pessoas são levadas pela circunstâncias ao invés de as moldarem por conta própria. Requer um exercício de auto crítica e conhecimento que muitas vezes pode ser doloroso e por isso é descartado. Mas uma vez tomada a decisão, compensa.

Essa tese precisa ser adaptada aos profissionais liberais que exercem o mesmo ofício por décadas. Nesse caso, é notório que se vive em um ambiente de contínuo aprendizado onde a complexidade dos casos tratados aumenta com o tempo, imagine o quão desgastante seria para um advogado fazer a mesmíssima coisa por anos a fio. Da mesma maneira, um médico passa a chefiar equipes, tratar de casos mais complexos, gerir clínicas. Em todos os casos, a necessidade de mudar e construir novos ciclos se faz presente.

É a lei da vida. E você, já pensou qual o momento adequado para seu próximo ciclo?  Terá a coragem de decidir por ele?

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