Nada do que foi divulgado nas 73 delações de executivos da Odebrecht é surpreendente. Os mecanismos do capitalismo de compadre brasileiros já eram conhecidos há tempos, mas escancará-los em doses cavalares para o consumo popular causa uma certa comoção. Uma verdade inconveniente, que incomoda o usual conformismo tropical.
É importante que se diga que ao delator cabe o ônus da prova para que se beneficie com o abrandamento de sua pena. Não basta uma bela história, deve-se comprová-la. Tem sido assim na operação Lavajato. Para desespero da maioria dos delatados, as provas normalmente chegam.
E como será o Brasil pós delação do fim do mundo? Ela é só o começo de um ciclo de grandes revelações: OAS, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, entre outras, devem ter muito o que falar. Ou algum ingênuo pensa que só a Odebrecht comprava a alma da politicalha? E quando abrirem a caixa preta do BNDES? Podemos inferir que a delação da Odebrecht é a primeira de várias bombas atômicas a cair sobre o território político nacional.
Teremos sobreviventes?
Com certeza. Hoje, são pouco mais de 80 ‘autoridades’ com mandato envolvidos nessa leva, digamos que essa quantidade duplique ou triplique, ainda nos restará talvez metade do Congresso distante das maracutaias. Quem sobreviver deveria ter preferência popular para uma eventual reeleição. Não roubar é uma virtude aqui pelas bandas de Bovinolândia.
Voltemos a nossa atenção aos caciques. Do trio PT, PSDB e PMDB não sobrou um fora da lama. Lula e Renan são os líderes em indiciamentos. O primeiro é penta réu na Justiça comum. Sem foro privilegiado, deve ser condenado ainda nesse semestre e poderá ser preso antes das eleicões. Renan está seriamente ameaçado de não se reeleger senador em Alagoas, e nesse caso, teria destino semelhante ao do seu colega Eduardo Cunha. Como seu filho, governador, será candidato à reeleição, ele está impedido por lei de candidatar-se à Câmara, saída fácil para todos os senadores delatados. Por essa razão, é o mais desesperado entre eles, sofre em uma encruzilhada.
O triunvirato tucano submergiu. Aécio e Serra bastante encrencados, seguidos por Alckmin, o santo com um cunhado suspeito. Descobre-se, mesmo que tardiamente, a razão de tanta frouxidão na oposição ao petismo. Quando o rabo está preso, o sentido da fala é prejudicado. O mandato do mineirinho termina ano que vem, difícil imaginar o eleitorado de Minas lhe proporcionando mais 8 anos no senado. A saída seria a vaga de deputado. Uma espécie de rebaixamento, mas certamente melhor que o frio de uma cela em Curitiba. José Serra tem mais quatro anos de mandato, o que não deixa de ser um alívio para si. Seu capital político desintegrará, mas ainda terá o foro lhe resguardando de maiores dores de cabeça. Alckmin nutre esperanças de ser candidato a presidente, cada vez mais rarefeitas. As circunstâncias passarão por cima do seu desejo.
Nenhuma surpresa em relação ao PMDB, afinal, eles estão no poder há muito tempo, natural que sejam protagonistas da esbórnia. E que tal os paladinos ‘anti-golpe’: Lindberg, Glesi, Maria do Rosário, Vanessa Graziottin, Tião e Jorge Viana, Manuela D’avila: comunistas ou socialistas bebendo na fonte do capitalismo selvagem, uma beleza!
Apesar da comoção sem precedentes, não podemos nos esquecer de que os políticos com mandato estão protegidos pelo foro privilegiado. Se no Mensalão, um caso muito mais simples, o processo levou 7 anos, não seria realista esperar algo mais rápido que uma década. Muitos casos prescreverão até lá.
Por outro lado, mandatos não são vitalícios. Sem eles, as ‘autoridades’ são submetidas à justiça comum. A ironia nesse caso é que os eleitores, usuais críticos de seus representantes, serão os magistrados em Novembro de 2018. Em suas mãos estarão os destinos de quase todos os políticos implicados nas delações de agora. Reelegê-los seria o equivalente à absolvição.
Alguns analistas sustentam que a sucessão de escândalos comoditizará a bandalheira, a tal ponto que a população, enojada em um primeiro momento, se conformará bovinamente com o mantra de que todos roubam. É uma possibilidade. Se for assim, abraçaremos o atraso, e endossaremos a usurpação do estado por parte dos canalhas de sempre.
A outra alternativa é a faxina geral. Seria extraordinário que promovêssemos o encontro dessa turma com os Moros e Bretas da vida. Aí sim poderíamos considerar que as delações da Odebrecht são um ponto de inflexão na cultura patrimonialista patrocinada pelo nefasto capitalismo de compadre vigente no Brasil. Ainda temos 18 meses para o dia ‘D’. Nesse período, certamente assistiremos às tentativas sorrateiras de sobrevivência dos ratos: anistia, voto em lista e outras artimanhas estarão em pauta. A vigilância deve ser contínua. No final, o tal acordão não sairá sem a concordância da Justiça e da população.
Sim, você terá o poder de decisão e de influenciar os desatentos. Não desperdice essa oportunidade, talvez única na história, de refundar um país.
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Victor Loyola
Os textos refletem minha opinião pessoal sobre qualquer assunto, não há nenhum tipo de vinculo com corporações, grupos, ou comunidades. Comentários são extremamente bem-vindos. Me esforçarei ao máximo para fazê-lo um hobby permanente. No segundo tempo de minha vida, está definido que continuarei escrevendo. Se eu parar, de repente é por que eu surtei ou houve algum apagão de criatividade. Essa versão do blog está turbinada – é para ser mais agradável e acessível ao leitor. Há até um espaço para enquetes, uma maneira bem-humorada para encarar o mundo. Boa leitura!!!!!
6 Comentários
Simone Barbosa
14 de abril de 2017 em 23:01Victor suas consideraçoes descrevem muito bem a situaçao atual. Indignada e assim que me sinto e por outro lado, que bom que a limpeza vai começar. Muitos anos foram necessarios para que a verdade viesse a tona. Acredito que o futuro dos meus netos, ainda nao os tenho, possa ser melhor.
Victor
14 de abril de 2017 em 23:54Simone, concordo que o país vai melhorar dos netos em diante…talvez vejamos um pouco disso…
José Eduardo Vaz Guimarães
15 de abril de 2017 em 00:22Parabéns meu amigo . Tremendo texto . Direto no Ponto .
Acho que podemos ter o principal momento de inflexão do nosso País e transformar o jeito de fazer negócio com a Máquina Pública .
Victor
15 de abril de 2017 em 01:04Zé, esse é daqueles momentos definitivos. Se não for agora, racha…
Roberto Giangiardi
15 de abril de 2017 em 01:49Caro amigo Victor parabéns pelo texto.
Deprime, irrita, debocha, revolta! Mas essa onda que a tudo e a todos atinge vai sim produzir uma limpa.
Como disse o patrono da ODEBRECHT:
“Faço isso há 30 anos”
Que venham os próximos 30, com outros problemas, outros desafios mas geridos por NOVAS cabeças.
Merecemos!!!
Victor
15 de abril de 2017 em 02:40Merecemos mesmo. Faxina geral!