A escalada da criminalidade e o ‘risco’ Bolsonaro

São quase 60 mil assassinatos por ano, dos quais apenas 8% tem solução. De cada dez homicídios no planeta, um ocorre no Brasil, representatividade bem maior do que a sua população no mundo (um em cada trinta e seis terráqueos vivem aqui!). Nos próximos 9 minutos, alguém será a próxima vítima.

Boa parte dessa barbárie ocorre junto às camadas mais pobres da população. O andar de cima, menos alvejado por assassinatos, sofre com assaltos, sequestros, balas perdidas e ameaça constante de fazer parte da estatística no dia seguinte. Não há no Brasil quem não seja potencial alvo de violência. É quase impossível conhecer pessoas de seu círculo próximo que não experimentaram a desagradável sensação de impotência diante de um criminoso armado, e os que não foram pessoalmente protagonistas de uma situação dessas podem se considerar felizardos. Você certamente conhece ou ouviu falar de alguém próximo que foi assassinado. Tudo isso é típico de país em guerra.

Difícl encontrar as razões pelas quais o Brasil se tornou o ‘lugar’ mais violento do mundo, uma conjunção de fatores nos levou à situação de banalização da violência. Há três décadas, o índice de homicídios per capita beirava 10 para cada 100 mil habitantes. Alto, mas não a ponto de ser considerado epidêmico. Hoje, ele é quase 3 vezes maior e 38% das 50 metrópoles mais violentas da Terra são brasileiras. A capital com menor índice de assassinatos no Brasil, pasmem, é São Paulo, onde a bandidagem rouba, mas não mata (13 homicídios para cada 100 mil habitantes). Algumas cidades nordestinas tem indicadores dignos de ruborizar sírios, iraquianos e afegãos, países que abrigam organizações terroristas.

O recrudescimento da violência ocorreu em um período onde a desigualdade caiu. Aliás, no Nordeste, exemplo desse fenômeno, o índice de assassinatos foi às alturas. O argumento de que a pobreza ou a desigualdade são as causas originais da violência não conversa com a realidade. Há inúmeros países mais pobres e similarmente desiguais ao Brasil e que nem por isso registram índices de matança tão altos. Por outro lado, a escalada do tráfico de drogas e a ausência do Estado nas periferias e comunidades mais carentes ajudaram a criminalidade prosperar. A certeza da impunidade também. E aqui, temos um paradoxo desafiador: quando fala-se em impunidade, a primeira visão que temos é de cadeias vazias, o que também não é o caso brasileiro, que conta com a quarta maior população carcerária do mundo: pouco mais de 600 mil presos, contra 673 mil na Rússia, 1.6 milhões na China e 2.2 milhões nos EUA. É bastante, mas nada anormal para a quinta nação mais populosa.

Dessa informação, infere-se que deve haver muitos ladrões de galinha encarcerados, enquanto figurões do crime permanecem livres ou mesmo que as prisões são insuficientes. Mantida a proporção de preso/habitante dos EUA, nossas cadeias abrigariam 1.4 milhões de pessoas, ao invés das 600mil. Se a equivalência fosse com a Rússia, seriam quase 1 milhão. Já imaginaram? Não será o caso, culturalmente somos muito mais tolerantes que americanos ou mesmo russos e isso aplica-se também na relativização da gravidade dos delitos. De qualquer maneira, há uma sensação generalizada de que a impunidade reina soberana por essas bandas e o próprio índice baixo de resolução de homicídios comprova isso. Nossos 8% aqui se comparam a 66% nos EUA e quase 90% no Reino Unido. Onde o risco para o criminoso é mais baixo?

A população dá sinais de que não aguenta mais e está exausta com a pasmaceira governamental para resolver esse problema. É importante lembrar que a segurança pública é responsabilidade dos governos estaduais, mas o federal, através do combate ao narcotráfico e ao crime organizado, o Congresso Nacional, pela formulação de leis eficazes que intimidem a bandidagem e o Poder Judiciário, pela agilidade no julgamento dos processos, deveriam ser parceiros e co-responsáveis na solução. A segurança pública e a criminalidade são assuntos que demandam ação conjunta dos três poderes.

Falta-nos, entretanto, lideranças que tratem o tema como prioridade. Não se vê uma mobilização nacional para reverter esse quadro assustador. A criminalidade está nas alturas há muito tempo e pouquíssimo é feito para reduzí-la. Nesse sentido, é fácil entender a ascensão do deputado Jair Bolsonaro nas pesquisas eleitorais para a presidência da República.

Originalmente um obscuro deputado do baixo clero, militar de formação, suas declarações bombásticas frequentemente abordam o tema com vigor. Alguém se lembra de algum discurso de Lula, Marina, Ciro Gomes e outros sobre o problema? Podem até já ter falado do assunto, mas não é prioridade em suas pautas. Dos nomes ventilados à presidência, talvez o único que tenha algo a dizer seja Geraldo Alckmin, governador do estado com o segundo menor índice de homícidos do país, e a capital mais segura. Contra ele, porém, pesa a escalada de furtos e assaltos.

A esquerda tem dificuldade histórica para tratar do tema, frequentemente a encontramos na defesa dos direitos dos bandidos, e isso pode lhe tirar muitos votos. O discurso contra a violência é capaz de arregimentar multidões.

Tal qual o falastrão Donald Trump, que encontrou nos eleitores brancos e sem formação universitária da classe média baixa americana um filão para pregar contra a globalização e vulnerabilidade econômica, tema que lhes era muito sensível, Bolsonaro pode conquistar os eleitores cansados da excessiva tolerância com a bandidagem, causa que ele abraça há tempos. É verdade que a economia e o desemprego são temas caros a todos, mas a escalada da violência também está no topo das prioridades. Exemplo disso foi a reação de entusiasmo da população com a exitosa ação da Polícia Civil de São Paulo, que eliminou 10 bandidos de uma quadrilha que assaltava casas na cidade.

Sabemos que um marqueteiro mediano consegue criar um candidato e um bom comunicador pode vestir qualquer fantasia. Não seria difícil transformar o Jair, mesmo tosco, em alguém com mais conteúdo que o velho discurso de brucutu do quartel. ‘Tosco, mas honesto’, dirão seus defensores. E no mar de denunciados e encrencados da política nacional, isso é uma virtude.

A luta contra a violência e criminalidade deve ser abraçada por todos que desejem ocupar o palácio do Planalto, sob o risco de se tornar propriedade exclusiva de Jair Bolsonaro. Essa situação hipotética, poderia, por que não, transformá-lo de de personagem exótico a protagonista das próximas eleições. Aos céticos, é sempre bom lembrar o exemplo americano. A zebra está solta, melhor abrir os olhos.

1 Comment
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1 comentário

  1. Márcia

    8 de setembro de 2017 em 03:09

    Brasil e suas leis…… além do auxílio reclusão…..bolsa disso, bolsa daquilo…..cota aqui, cota acolá….

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