‘Dopingmania’

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Essa semana foram divulgados alguns casos de doping envolvendo atletas de primeiríssimo escalão dos EUA e Jamaica, velocistas com medalhas olímpicas, celebridades do mundo esportivo. Esses casos somam-se a inúmeros outros do atletismo e diversas modalidades, situações que tem desmascarado supostos campeões de maneira tão arrebatadora quanto seus falsos triunfos.

 
Está cada vez mais difícil colocar a ‘mão no fogo’ por qualquer atleta de alta performance quando o assunto é doping. As artimanhas para ocultar substâncias proibidas parecem sobrepujar os métodos de identificação toda vez que um suposto campeão é flagrado; imediatamente surgem as indagações sobre a extensão do uso e seu real efeito em competições anteriores: por quanto tempo a deslealdade prevaleceu? Isso naturalmente coloca em cheque a credibilidade dos grandes eventos esportivos, particularmente nas modalidades individuais.
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À medida em que a batalha contra o doping parece arrastar-se para uma derrota eterna, algumas vozes começam a ecoar a sugestão de que o mesmo seja liberado, situação que ao menos nivelaria os atletas, eliminando injustiças, e traria muito mais transparência ao esporte. Trata-se de uma proposta politicamente incorreta, mas vale a pena refletir sobre seus efeitos.
 
 
 
imageOs mais puristas alegam que qualquer doping é uma fraude e sua utilização contraria o princípio de testar os limites da performance humana. Não deixa de ser verdade, mas se a competição em si e seus frutos comerciais passaram a ser mais relevantes que esse princípio, permitir o acesso de qualquer atleta às substâncias hoje proibidas coibiria a picaretagem, termo adequado a quem se vale desse subterfúgio para obter vantagens contra seus competidores honestos. Será que os resultados das inúmeras Voltas da França ‘roubadas’ por Lance Armstrong não seriam mais justos se todos os competidores tivessem acesso ao seu procedimento de doping? Para pensar…
 
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Aos que alegam que tal medida seria comparável à descriminalização das drogas ( outro tema controverso), eu rebateria dizendo do alto da minha ignorância médica que as substâncias proibidas não são ‘viciantes’  e visam melhorar a performance atlética do indivíduo, mesmo que por um breve período de tempo. Seriam análogos a agrotóxicos aplicados à colheita. Em um mundo perfeito, teríamos somente alimentos orgânicos. Mas ele não existe e a prova disso no esporte são as sucessivas demonstrações da fragilidade da natureza humana diante da tentação do doping.
 
 
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Para quem considera a Fórmula 1 um esporte, temos uma tremenda analogia em um suposto mundo com o doping legalizado. O atleta seria equivalente ao piloto. Talento continua fazendo a diferença, mas os títulos são provenientes do conjunto piloto-carro, idênticos ao binômio atleta + substância química. Os grandes laboratórios desempenhariam o papel das equipes e farmacêuticos e químicos o dos engenheiros.  No automobilismo, em que pese o fato da qualidade do equipamento ser decisiva, ela não interfere na diferenciação de pilotos geniais de outros medianos. Algo semelhante poderia ocorrer em um cenário onde a ‘dopingmania’ fosse prática comum. Em ambos os casos, a condução irresponsável do ´equipamento´pode ser fatal e o piloto ou atleta estão sempre em risco. Imagino que até a apresentação dos últimos seria diferente: ‘ Fulano de Tal usa a substância Efedrinina, patrocinada pelo Laboratório X, liderada pelo farmacêutico-chefe Ciclano de Tal’. Ou então: ‘ Beltrano mudou recentemente de Efedrinina para Xelomina e assinou um contrato milionário com o Laboratório W.’
 
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Nas últimas olimpíadas, a Federação Internacional de Natação aboliu o uso de maiôs especiais, que não deixavam de ser um tipo de ‘doping’. Nesse caso, prevaleceu o argumento purista que defendia a tese de que a performance do atleta era artificialmente melhorada pelo tipo de tecido. E daí? Se todos tem acesso, não desvirtua a competição. É claro que isso também gera uma busca pelo melhor material, fato que em um segundo momento modifica a balança de forças: entre dois competidores com performances iguais, aquele com a roupa mais eficiente seria vitorioso. Ampliaria-se o escopo da competição, que não mais se restringiria somente aos indivíduos.
 
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Mas não estamos exacerbando o valor da competição, a tal ponto que métodos escusos, utilizados por sabe-se lá quantos atletas, ameaçam seriamente a veracidade dos resultados?  A incapacidade em coibir o uso do doping e a vulnerabilidade dos métodos de detecção reforçam o argumento dessa proposta, digamos, pragmática: o doping é para todos! Cabe uma reflexão…
 
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