Para que um chefe de estado seja impichado, deve estar sob uma tempestade perfeita, que normalmente é concebida pelo próprio.
São três os elementos, que se existentes ao mesmo tempo, proporcionam o ambiente para que o parlamento simplesmente assopre o (a) presidente para fora do cargo.
Dito dessa maneira, parece algo simples, mas não é. Constitui-se em evento raríssimo que somente ameaça políticos muito inábeis.
O primeiro dos elementos é a economia em frangalhos. A grosso modo, ela dita o humor das ruas. É impossível afastar um presidente no comando de um país em crescimento acelerado, gerando empregos e criando oportunidades de prosperidade aos seus cidadãos.
Some-se a esse fator, a alta impopularidade. Se a economia estiver mal e o presidente se mantiver razoavelmente popular, também é difícil emplacar qualquer ação de afastamento. Normalmente, a draga econômica arrasta o governo para altos índices de reprovação, mas isso não é imediato e mesmo assim pode haver um teto mínimo sobre o qual o líder do executivo se arrastará até o fim do mandato.
O terceiro elemento é o mais difícil de existir, trata-se da incapacidade do governo angariar ao menos um terço de apoio no Congresso. Convenhamos, para quem detém a máquina pública, é um feito e tanto.
Uma economia em frangalhos, um governo altamente impopular e incapaz de captar apoio de 1/3 do Congresso derrubam qualquer presidente. Mas e a justificativa? Arruma-se uma, na prática é o que menos importa. O impeachment é um processo eminentemente político.
Collor e Dilma trilharam o mesmo caminho do isolamento, experimentaram um período de recessão histórica e eram, em seu tempo, altamente impopulares, com menos de 10% de aprovação. Não à toa, caíram.
O exemplo mais recente de Dilma Rousseff é didático. O Brasil mergulhou em uma recessão profunda graças às suas escolhas econômicas, sua impopularidade acelerou rapidamente no começo do segundo mandato, proporcional à quantidade de mentiras espalhada em campanha e ela conseguiu afastar o PMDB de sua base de apoio, primeiro patrocinando a criação do PSD para se contrapor aos aliados, depois com lançamento de candidatura própria à Câmara dos Deputados, subvertendo protocolo tradicional. Converteu amigos em inimigos. O resto é história.
Sob essa ótica, seria impossível visualizar Michel Temer, Lula ou FHC impichados, mesmo que estivessem mergulhados em recessões amplamente impopulares, pois todos eles eram políticos habéis e que em nenhuma hipótese deixariam de contar com ao menos um terço do parlamento.
O governo Jair Bolsonaro obviamente está longe de um cenário desses, uma vez que a economia, apesar de estagnada, dá sinais de vida, e o presidente, mesmo sendo um polemista despertador de amor e ódio, segue com apoio sólido de 1/3 da população. Ambos os cenários, porém, são dinâmicos e podem mudar ao longo do tempo.
Mas espanta a relação tortuosa que ele mantém com o parlamento, cada semana um treta. Confusões geradas em meio à calmaria, conflitos no próprio partido, acusações de traição a granel. O presidente se assemelha aos impichados anteriores, é possível visualizá-lo isolado no Congresso, sem base de apoio. Converge com seu temperamento e estilo de fazer política.
Não faço aqui nenhuma ilação de que esse é um cenário provável, apenas constato que se estivesse sob fogo cruzado de uma crise econômica conjugada com alta impopularidade, o que não é o caso no momento, dificilmente Bolsonaro conseguiria segurar o Congresso. Ele não está protegido pela própria habilidade política.
Divirto-me muito com as vociferações da esquerda de que o impeachment de Dilma foi golpe, discurso que ignora todos os fatores acima. Impeachment nunca é golpe, por se tratar de um legítimo movimento político. Ou, no limite, será sempre um golpe, na visão do impichado.
Na prática, o que importa é avaliar se as condições para que ocorra uma tempestade perfeita estão presentes. Sobre o governo atual, o que sabemos é que a primeira família tem o hábito de destruir pontes, ao invés de construí-las, característica que seria bastante tóxica em um cenário de crise.
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Victor Loyola
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