O Brasil elegerá seu presidente em Novembro para assumir a posição em um dos mais difíceis momentos de sua história, após o pior quadriênio já registrado pelo alcance das estatísticas, com PIB acumulado reduzindo 5%, queda de quase 10% na renda per capita, índice de desemprego de 12%, R$ 140B em déficit primário, dívida pública beirando 80% do PIB e ascendente, escândalos de corrupção que desintegraram os principais partidos políticos, inúmeras reformas controversas a serem discutidas e implantadas e uma sociedade fraturada pelo embate do ‘nós X eles’. Definir a missão do próximo mandatário como impossível está muito próximo da realidade.
Infelizmente, o destino nos proporcionará opções aquém do ideal para essa árdua tarefa. Tivemos uma amostra do que nos espera no primeiro debate prrsidencial realizado pela Rede Bandeirantes nessa quinta. É verdade que o seu formato não ajuda: tempo muito escasso para responder às perguntas de jornalistas ou mesmo de oponentes, e ainda mais curtos para réplicas e tréplicas. Isso sem contar a bizarrice de ter, ao menos temporariamente, a candidatura de um presidiário como uma possibilidade. Em qualquer lugar civilizado que se dê ao respeito, preso nem pode se registrar.
Para quem assistiu às entrevistas dos principais candidatos na Globo News semana passada, sabia-se que difícilmente eles teriam algo a acrescentar. As novidades ficariam por conta de Henrique Meirelles, Guilherme Boulos e Cabo Daciolo, todos com traço ou quase isso nas intenções de voto.
Foi um debate muito pobre em conteúdo, um dos piores que eu já vi. Não fosse pela figura exótica do Cabo, nem engraçado seria.
Álvaro Dias, por quem eu não tinha rejeição até ontem, teve um desempenho horroroso. Confuso, excedia o tempo das perguntas, misturava ‘lé com cré’ nas respostas, floreadas com um vocabulário empolado e pouco objetivo, quase um ‘Rolando Lero’. Repetiu à exaustão o nome do juiz Sérgio Moro, de maneira até leviana, pois duvido que o magistrado tenha aceito um suposto convite para ser o Ministro da Justiça. Esteve à altura de um Eduardo Suplicy em confusão mental, velocidade e estruturação das ideias. Um fiasco.
Cabo Daciolo, apresentou-se ao Brasil com um ‘Glória a Deus’ e saiu distribuindo bordoada em tudo e todos, para posteriormente dizer que nos faltava amor ao próximo e sobrava dinheiro, e que a crise era uma mentira. Torturador da gramática, desrespeitou regras básicas de concordância verbal ao melhor estilo Lula e nos brindou com uma sequência de ideias desconexas, sem nunca esquecer de usar o nome de Deus em vão. Foi trágico e ao mesmo tempo cômico.
Marina Silva não é uma má debatedora, mas já perdeu o verniz de novidade. Seu discurso conceitual não emplacou nas duas eleições anteriores e ela por enquanto não conseguiu fugir da mesmice, com uma dificuldade adicional de se posicionar em questões polêmicas. Contrária ao aborto, a candidata é reticente em defender sua posição, certamente com receio de desagradar aos simpatizantes da causa e apela à convocações de plebiscitos toda vez que uma controvérsia vem à tona. Favoràvel à responsabilidade fiscal, posicionou-se de maneira muito crítica à lei do teto dos gastos, incapaz de explicar como resolveria o problema. Seu discurso é repleto de críticas e conceitos, mas vazio em soluções. Não polemizou e nem empolgou. Sem tempo de TV, começa a corrida com um bom ‘recall’, mas corre o risco de ver sua candidatura desinflar ao longo dos próximos dois meses. Tive certeza disso quando falou que o lobo mau quer comer o dinheiro da vovozinha.
Jair Bolsonaro repetiu as ideias já proferidas no Rodaviva e Globo News, em entrevistas concedidas recentemente. Controlou os nervos e evitou cair nas provocações de Boulos, chegou a fazer tabelinha com Álvaro Dias e reagiu com sincero bom humor à estapafúrdia proposta de Ciro para pagar a dívida dos 63M de inadimplentes. Repetiu os bordões que o consagraram e seu discurso de fechamento, memorizado, não deixou de citar família, patriotismo e Deus. Diferentemente de Marina, não tem receio em se posicionar. Quem apostou que perderia a compostura, se deu mal. No final, quase caiu em tentação ao contrapor uma citação de Ciro, mas resistiu. Saiu do debate sem brilhar, mas do mesmo tamanho que entrou. Segue forte candidato.
Henrique Meirelles é um peixe fora da água. Aprendeu ontem que políticos não entendem alguns conceitos econômicos e formulam opiniões a partir de uma realidade distorcida. Também descobriu que não adianta explicar essas falhas em dois minutos. Tentou se posicionar como o salvador da pátria de Lula e Temer, algo que deve explorar na campanha, mas carente de carisma e votos, pode terminar a eleição como nanico. É difícil para um tecnocrata acostumado a dialogar com interlocutores globais sofisticados, adaptar-se à convivência com um cabo Daciolo, ou um ativista invasor de terrenos, mesmo que por poucas horas. Apesar da profundidade em temas econômicos, falta-lhe traquejo para lidar com as questões mundanas da política.
Geraldo Alckmin fez o que se esperava dele. Explicou didaticamente suas propostas, e saiu pela tangente nos temas constrangedores ligados à corrupção do PSDB e Centrão. Foi o mais escolhido entre os candidatos para responder às perguntas, e o fez sempre com seu estilo pouco entusiasmado. Porém, goste-se ou não dele, é inegável que seja o mais experimentado para a função, afinal, são 13 anos à frente do estado mais rico do país e não há tema administrativo com o qual não tenha familiaridade, pela natureza do cargo que ocupou por tanto tempo. Mesmo assim, se quiser vencer as eleições, terá que aproveitar muito bem seu latifundiário tempo de TV. Dentro de suas características, Geraldo foi bem no debate.
Ciro Gomes vestiu a carapuça de demagogo ordinário, ao repetir mais uma vez a intenção esdrúxula de quitar as dívidas dos 63M de inadimplentes, como se houvesse dinheiro para tal ou fosse possível institucionalmente. Macaco velho, o coronel sabe disso e sua insistência no tema tem como objetivo causar ruído e conquistar votos de cabresto. Fora isso, transitou com sua peculiar retórica articulada por temas diversos, e pasmem, não ofendeu ninguém, além de tratar seus adversários como ‘ilustres colegas’. Certamente agradou aos já convertidos e irá buscar os votos dos órfãos do presidiário para ir ao segundo turno. Ontem, com pouco tempo para se manifestar, não conseguiu elaborar suas já afamadas mentiras com jeito de verdade.
O sonho de Guilherme Boulos é ser Lula. Jamais conseguirá, primeiramente por que ele sabe falar sem humilhar a língua portuguesa, coisa que o grande chefe nunca conseguiu fazer. Combativo e bom comunicador, disse algumas verdades, particularmente quando tratou da desigualdade, impostos e corrupção. Sabe-se que o reconhecimento de um problema não garante sua solução, e o socialista está longe de tê-las para os diversos assuntos. Descobriu um bordão popular, ‘os cinquenta tons de Temer’, que repetiu até ficar sem graça, e apesar de portar-se como uma metralhadora giratória, suas provocações foram ignoradas pelos adversários. Seu objetivo ali era crescer no eleitorado petista, de quem é linha auxiliar e provavelmente conseguiu seu intento. Hoje, com certeza tem mais votos que Meirelles.
Não é possível determinar um vencedor para o debate, pois quem já tem preferência por um candidato é mais condescendente na sua avaliação, e mais rigoroso em relação aos seus desafetos. Está claro, porém, que há carência de qualidade.
Alckmin e Boulos devem ter saído com a sensação de dever cumprido. O primeiro confirmou a imagem de administrador experiente e o segundo de promissor líder esquerdista. Com mais alguns debates como esse antes do primeiro turno (sob formato semelhante) , provavelmente memorizaremos os discursos de todos eles, o que não chega a ser uma vantagem, pois a realidade teima em desmentí-los a após a posse.
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Victor Loyola
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