A mãe e o pai do custo Brasil: um exemplo banal

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O Brasil de extensão continental oferece pouquíssimas opções de viagens internacionais curtas. As menos cansativas são para Buenos Aires, Montevidéu ou Assunção,  alcançáveis a não mais que duas horas e meia de voo da capital paulista. Os próximos trajetos mais ‘fáceis’ duram umas quatro horas e depois disso temos jornadas que normalmente ultrapassam oito de duração. Ou seja, o desembarque internacional no aeroporto de Cumbica está repleto de gente cansada após uma noite mal-dormida. Com filas que não raramente oferecem aos brasileiros um tempo de espera maior que o dos visitantes estrangeiros, o período que antecede a apresentação do passaporte é um convite à reflexão.

Nos 10 ou 15 minutos de espera para chegar aos guichês, o pensamento do sujeito passa pelo recolhimento da bagagem e na outra viagem que será o trajeto do aeroporto à sua casa, se morar em São Paulo. Em caso de conexão para outra cidade, na incoveniência da espera até o próximo embarque. Em ambos os casos, pode pairar a dúvida se ele será fiscalizado pela Receita Federal, em sua busca aleatória por badulaques. Pobre do país que precisa arrochar o limite de valor dos produtos importados, sinal de que não é eficiente para produzí-los internamente.Eis a palavra mágica: eficiência. E o que ela tem a ver com a fila de espera para apresentação do passaporte? Pois não é que ali, na primeira interação dos brasileiros com seu país, temos uma extraordinária demonstração de ineficiência e paternalismo, duas das maiores pragas que encontramos pelas bandas de cá?

Os passaportes ditos digitais ( com código de barras) dispensam a presença dos terceirizados da Polícia Federal. O viajante o insere em um leitor ótico, que aciona a abertura de uma porta e lhe permite dois passos adicionais, para que se posicione para a fotografia. Pronto, o sujeito está liberado. Todo procedimento é absolutamente simples, presente nos principais aeroportos do mundo e dispensa maiores explicações, de tão fácil que é. No terminal 3 do Aeroporto de Guarulhos, há umas cinco ou seis máquinas como essa, que supostamente proporcionam mais agilidade ao processo.

Até aí, tudo normal, não fosse a presença de dois ‘bedéis’ passando instruções aos passageiros: ‘coloquem o passaporte com a página virada para baixo’, ‘dê dois passos para frente’, ‘olhe para a câmera’ e outras obviedades. Uma atividade completamente dispensável para pessoas com um mínimo de capacidade cognitiva, que saberiam se virar sem instrutor. Em outros sítios não existe esse funcionário completamente dedicado, os viajantes seguem as orientações das placas auto-explicativas.

Essa situação ressalta a nossa ineficiência em um aspecto banal de um serviço público. O certo seria operar sem nenhum ‘bedel naquela área. É simplesmente desnecessário. Mas temos duas pessoas integralmente dedicadas à transmissão de informações, que monitoram os seis guichês. Haja paciência e necessidade de trabalho para se submeter a uma atividade tão banal. Agora vamos extrapolar essa situação para todas as esferas administrativas municipais, estaduais e federais. Quantos milhares de empregos desnecessários produzimos com nosso pendor para a ineficiência?

A segunda característica marcante proveniente dessa cena é o paternalismo. Ao destacar dois funcionários para atividade de explicar o óbvio, o estado brasileiro assume que seus cidadãos são idiotas, incapazes de completar uma tarefa corriqueira. Precidamos de babá. E o pior é que muitos de nossos conterrâneos gostam disso, sentem-se paparicados.

Essa mistura de ineficiência com paternalismo são a mãe e o pai do desproporcional custo Brasil do qual tanto reclamamos. O pior de tudo é que ambos não estão restritos aos serviços públicos. Experimente chamar alguém para completar uma tarefa em sua casa, não será surpreendente se vierem dois ou até mesmo três funcionários, dos quais apenas um trabalha e o resto assiste. Não é à toa que são necessários cinco brasileiros para produzir o equivalente a um americano. O mais desolador é que o aumento de nossa produtividade, baixíssima, não é pauta importante nos dias de hoje.

Chega minha vez. Ignoro as instruções do ‘bedel’, afinal eu não sou um imbecil.  Coloco meu passaporte no sensor, atravesso a porta, me posiciono em frente à câmera, tiro a  foto e estou liberado em menos de cinco segundos.

 

 

2 Comments
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2 Comentários

  1. Alberto Duarte

    21 de setembro de 2015 em 18:32

    Mais um otimo artigo, Victor. Abs.

  2. Márcia

    17 de outubro de 2015 em 09:40

    Lembrei de viagens terrestres mesmo passando por rodovias em reformas…..há sempre mais funcionários do que serviços por fazer. Incompreensível, inacreditável, indispensável….

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