O valor da jornada

jornada2

Há um ditado que diz: ´não há bons ventos para quem não sabe aonde quer chegar´. Trata-se de uma afirmação verdadeira, pois geralmente quem é ´carregado pela correnteza´ e não consegue definir claramente suas prioridades, tem grandes chances de se frustrar ao longo de sua trajetória pessoal e profissional. Por outro lado, estabelecer objetivos de curto e médio prazo sistematicamente para tudo não necessariamente é garantia de satisfação.

É comum encontrarmos indivíduos altamente estruturados na definição de suas metas. ´Daqui a um, dois, três anos quero estar fazendo isso ou aquilo, adquirir isso ou aquilo, casado, com filhos, viajado, etc.´ Quanto mais longo o prazo, mais difícil é materializar esses objetivos de maneira precisa. A tradicional pergunta em entrevistas: ´o que você quer estar fazendo daqui a 5 anos?´ normalmente é difícil e não ter a resposta tampouco é depreciativo. Sempre que eu entrevisto alguém, procuro evitá-la.

Há duas décadas eu também costumava manter esses objetivos bastante definidos em minha cabeça, preocupava-me sempre em estabelecer o ´próximo destino´, tão logo as metas  prévias  (ou ´destinos´) fossem atingidas. Era quase obsessivo. Nada de errado com isso, exceto o fato de que com o passar do tempo e com o incremento de obrigações, inevitáveis à medida que o sujeito amadurece, essa preocupação excessiva, além de ineficaz, causa um ´stress´ desnecessário que  atrapalha a vida de qualquer pessoa normal. Eis que gradualmente passei a valorizar muito mais a qualidade da jornada, e seu conteúdo, do que o próximo ´destino´ propriamente dito, sob o mantra de que se sua a jornada for boa, seguramente  lhe trará surpresas agradáveis nos ´destinos´ que fazem parte do seu roteiro.

É importante ressaltar que essa visão não significa alinhamento à filosofia da famosa canção do Zeca Pagodinho (´Deixa a vida me levar…´), o que seria um desprendimento exagerado em relação às nossas responsabilidades, mas sim um foco extremo em aproveitar tudo que a jornada nos oferece: seus êxitos e fracassos, suas escolhas e renúncias, suas recompensas e injustiças, seus desafios e aborrecimentos, seus sonhos e realidades.

jornada1A somatória de todos esses componentes definirá a qualidade da jornada. Uma trajetória onde tudo são flores (algo praticamente impossível) seguramente não será a mais rica. Muito pelo contrário, navegar em mares turbulentos na maioria das vezes agrega mais ao crescimento do indivíduo do que em calmaria. E uma jornada ‘rica´ contribui mais decisivamente para o crescimento pessoal e profissional.

Obviamente que não pretendo fazer aqui a apologia do sofrimento. Uma vida repleta de fracassos, renúncias, injustiças, tediosa e desprovida de sonhos será extremamente infeliz. Mas não existem êxitos permanentes, os fracassos muitas vezes catalisam um sucesso posterior mais amplo. Escolhas jamais vêm desacompanhadas da renúncia; ambas estão sempre juntas e para cada caminho trilhado, há outro que deixou de ser percorrido. Nem sempre temos a recompensa devida por tudo que fazemos, as injustiças são as armadilhas que atrapalham nossa trajetória, mas não podemos deixar que nos derrubem. Momentos altamente desafiadores que estimulam nossa adrenalina e criatividade são intercalados com períodos tranquilos, sonhos são muitas vezes desmentidos pela realidade, e nem por isso devemos deixá-los aprisionados.

Quanto maior a variedade das experiências advindas desses componentes, melhor a qualidade da sua jornada. Ela definirá qual o seu próximo destino e não o contrário. Por isso, ao invés de fazer a tradicional pergunta ´aonde você quer estar daqui a cinco anos´, prefiro indagar sobre qual experiência o sujeito deseja adquirir, em que tipo de ambiente ele(a) gosta de trabalhar, quais são as atividades pessoais em que busca aperfeiçoamento. As respostas a esses questionamentos trazem informações muito mais valiosas a respeito do indivíduo que uma eventual menção à meta ambicionada em cinco anos. Elas dizem respeito à jornada, e não ao destino. E,  ao contrário do que possa parecer,  quem valoriza a jornada sabe aonde quer chegar, pois aprecia as oportunidades de crescimento que batem à sua porta todos os dias, camufladas sob os mais diferentes aspectos.

Valorizar a ´jornada´ em detrimento do ´destino´ torna a rotina mais leve, reduz o nível de stress e consequentemente melhora profundamente a qualidade de vida. Pense nisso.

jornada3

6 Comments
0

6 Comentários

  1. Cezar Chiarantano Jr

    18 de janeiro de 2013 em 23:03

    Victor, belo texto. Gostaria de acrescentar que só Deus é capaz de nos prover a verdadeira Paz tanto para gozar as boas jornadas como suportar as mais desafiadoras. A verdadeira sabedoria do ser humano está em reconhecer que não somos donos de nossas vidas mas temos o dever de fazer o melhor. Abs

  2. sonia pedrosa

    19 de janeiro de 2013 em 12:11

    Belíssimo texto, como sempre!
    Podemos planejar a vida até certo ponto. O resto é com o destino e ninguém foge dele.
    beijo!

  3. Mario Serghio de Camargo

    7 de março de 2015 em 10:30

    Excelente Victor!

  4. Mario Serghio de Camargo

    7 de março de 2015 em 10:30

    Excelente!

  5. Suzana giacomelli

    7 de março de 2015 em 16:22

    victor , belíssimo texto !
    Para reflexão sobre a vida …
    Parabéns !!
    Suzi

  6. Márcia

    14 de março de 2015 em 07:58

    Lendo esse texto, me fez pensar que só a maturidade nos faz “valorizar a jornada em detrimento do destino”. Quando jovens temos pressa, com o tempo percebemos que o tempo não para e voa cada vez mais rápido. Talvez por isso não achamos HOJE tão mais importante pensar em como estaremos em 5, 10 anos….também vou mudar essa pergunta nas minhas conversas… não faz mesmo tanto mais sentido. Belíssima reflexão!

Deixe uma resposta para Mario Serghio de Camargo Cancelar

Send this to a friend