O Risco



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Diariamente, experimentamos as consequências de nossas escolhas. Salvo raras exceções, temos no mínimo duas delas diante de qualquer situação. Escolher entre o trajeto usual para o trabalho e um atalho, entre ser mais ou menos severo diante de uma peraltice de seu filho, entre estar em um emprego ou outro, entre fazer ginástica ou não fazer nada, entre sair com os amigos ou ficar em casa, priorizar as inúmeras atividades profissionais pendentes, são todas situações comuns que envolvem risco e recompensa. Sem perceber, fazemos a gestão de risco de nossas vidas nas atividades mais cotidianas.

Existe uma assimetria na maneira em que tomamos decisões relativas a perdas e ganhos. O exemplo a seguir, de uma pesquisa universitária americana (Kahneman e Tversky) , demonstra isso:

risco1Na primeira experiência, os entrevistados foram solicitados a escolher entre uma opção (A) onde eles teriam 80% de chance de ganhar 4.000 e 20% de ganhar zero e outra alternativa (B), onde eles teriam 100% de chance de ganhar 3.000.

Oitenta por cento (80%) dos entrevistados escolheram a opção (B), mesmo com a expectativa matemática de retorno de (A) ser maior. Nesse caso, tivemos um resultado com majoritária aversão a risco.

Em uma segunda experiência, os entrevistados foram solicitados a escolher entre uma opção (A) onde eles teriam 80% de chance de perder 4.000 e 20% de perder zero e outra alternativa (B), onde eles teriam 100% de chance de perder 3.000.

Noventa e dois por cento (92%) dos entrevistados escolheram a alternativa A, mesmo com a probabilidade de perda maior. Nesse caso, os mesmos entrevistados foram majoritariamente ‘tomadores de risco’.

Como explicar o fato dos mesmos entrevistados terem feito escolhas diametralmente opostas nas duas experiências?  A primeira conclusão é que em situações que envolvem ganhos, as pessoas tem mais aversão a risco (‘risk averse’), e em situações que envolvem perdas, são tomadoras de risco (‘risk takers’).

Os pesquisadores incluíram uma outra pesquisa, cujos resultados foram ainda mais intrigantes: Imagine uma doença rara que afete uma comunidade, com expectativa de matar 600 pessoas. Dois tratamentos estão disponíveis para combatê-la. No primeiro (A), 200 pessoas serão salvas com certeza. No segundo (B), há 33% de chances de salvar todas as pessoas e 67% de não salvar ninguém. Nessa situação, 72% dos entrevistados escolheram o primeiro tratamento (A), uma opção claramente aversa a risco.

Agora, considerando o mesmo problema colocado de forma diferente: No primeiro tratamento (A), 400 pessoas morrerão com certeza. No segundo (B), há 33% de chances de que ninguém morrerá e 67% de que todos morrerão. Nessa situação, 78% dos entrevistados escolheram o segundo tratamento (B), uma opção claramente tomadora de risco.

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Os resultados acima são completamente inconsistentes com o comportamento racional. Para o mesmo problema, as respostas foram muito diferentes. Segundo Kahneman e Tversky, isso comprova que as pessoas em geral não tem aversão a risco, elas conseguem conviver com a incerteza e até ‘apostar’, dependendo das circunstâncias, o que sim é fato é de que o ser humano comum odeia a ‘perda’.

A sensação de perda tem muito mais impacto que a de ganho. Existe uma outra teoria que sustenta que à medida que o último aumenta, o nível de satisfação obtida com cada  ganho adicional diminui. Em outras palavras, se o sujeito tem 100 e recebe outros 50, ele obterá um nível de satisfação. Com 150 e ganhando 50 adicionais, o nível de satisfação será menor que o obtido anteriormente. A conclusão derivada dessa situação é a seguinte: para aqueles que tem 150, dói mais perder 50 do que ganhar outros 50. Essa lógica denota um comportamento mais conservador em relação a ganhos futuros e mais agressivo em relação a potenciais perdas futuras.

Obviamente que essas teorias se aplicam ao comportamento convencional. Não há dúvidas de que as grandes histórias de sucesso envolvem em algum momento a tomada de risco. Também os grandes fiascos, que em sua maioria permanecem anônimos. Mas estaremos sempre condicionados à nossa avaliação subjetiva sobre o impacto que perdas e ganhos terão sobre a nossa ‘satisfação’.

Tal qual ocorre com os indivíduos, as corporações se deparam diariamente com situações que envolvem risco e recompensa. Esse conceito e as áreas que o circundam evoluíram muito na última década e hoje temos departamentos estruturados na gestão de risco, cuja complexidade é proporcional ao leque de situações nas quais uma organização pode experimentar uma perda financeira. Risco de crédito, cambial, de fraude, operacionais, são realidades de quem faz negócio. Não se pode fugir deles, a menos que você deixe  de transacionar. Uma área de gerenciamento de risco não deve ter o objetivo de eliminá-lo, mas sim controlá-lo de acordo com o apetite de risco de sua instituição e dentro de níveis que sejam aceitáveis para os reguladores do seu setor.

Tomando o risco de crédito como exemplo e com base no argumento acima, não há resposta certa ou errada para qual o nível de inadimplência ideal em um determinado portfólio. Depende do nível de tolerância a risco de cada empresa  e do resultado esperado. Eis um exemplo onde o nível de risco e receita (recompensa) andam juntos, sendo impossível dissociá-los. Uma inadimplência maior certamente está associada a receitas financeiras também superiores e como avaliar a relação entre ambas, otimizando os resultados para instituição sem comprometer a sustentabilidade no longo prazo, é função primordial de qualquer área de gestão de risco.

 Agora transborde essa teoria para a sua vida. Só não deixe que ela te paralise no trânsito, quando você estiver diante de inúmeras possibiildades de rota e pouco tempo para cumpri-la!

 

*** Para quem quiser se aprofundar na Teoria sobre Risco, aconselho o livro ‘ Against the Gods – the remarkable story of risk’ de Peter L. Bernstein, onde constam os detalhes das duas experiências relatadas nesse texto***

3 Comments
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3 Comentários

  1. José Carlos Ferreira

    7 de janeiro de 2014 em 21:50

    O que seria nossa vida sem ” riscos” ?

    1. Victor

      7 de janeiro de 2014 em 21:53

      Seria um tédio, Zeguinha! Abs

  2. Marcia

    17 de outubro de 2015 em 08:54

    Ar(risco) dizer que, em muitas situações, não gostamos mesmo de correr o risco…..optamos sim por seguir por um ou outro caminho quando nos deparamos na tal encruzilhada .
    A mesma coisa em outra perspectiva!

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