O errado fazendo o certo…e o certo fazendo errado

Quando você vê a pessoa certa fazendo a coisa errada, qual a sua reação? E a pessoa errada fazendo a coisa certa?

As culturas latinas em geral e brasileira em particular são carregadas de emoção, onde o culto às personalidades se destacam. Por incrível que pareça, nas respostas às perguntas acima, o brasileiro médio tenderia a colocar a pessoa como fator de avaliação, em detrimento de sua ação.

Em outras palavras, se você nutre uma simpatia por alguém, é provável que esse sentimento interfira na sua avaliação qualitativa sobre as atitudes dessa pessoa, podendo inclusive perdoar seus desvios de conduta. O contrário também é verdadeiro: não gostar de alguém é um catalisador de reprovações, independente das boas intenções ou da efetividade de suas ações.

Quando a razão prevalece, as pessoas perdem importância. A predominância é do senso sobre a atitude. Ou seja, a pessoa errada fazendo a coisa certa é digna de elogios, assim como um virtuoso fazendo a coisa errada merece ser criticado.

Temos dois exemplos ilustres na política brasileira da atualidade que comprovam empiricamente a tese. Vejamos o caso de Michel Temer, que criou no imaginário popular a condição de ‘pessoa errada’. Ele não abriu seu governo com essa marca, mas acabou fazendo por merecê-la ao escalar um ministério repleto de corruptos e adotar uma comunicação muito ruim, aliado ao fato de ter criado a percepção de traidor aos olhos de quem apoiava o governo de sua inepta antecessora. O fato de ficar marcado como ‘a pessoa errada’ não torna todas as suas ações ruins. Nesses dezoito meses de gestão, foi responsável por algumas reformas importantes em diversos setores (gasto público, educação, trabalhista, concessões), que antes experimentavam a mediocridade. Foram vitórias que podem deixar um legado positivo ao país no longo prazo. Mesmo assim, Temer segue sendo massacrado nas pesquisas de aprovação. Nas situações específicas da agenda econômica, ele é o caso típico da pessoa errada fazendo a coisa certa.

O exemplo oposto é o do Lula. Aos olhos de muitos, o jararaca é um santo, o representante de Deus na Terra. Essa percepção foi criada a partir da memória sobre um tempo de prosperidade que começou a definhar há uma década, no ocaso de seu governo, mas que é o último registro de aumento do bem estar coletivo que temos no país. Não importa se as circunstâncias ajudaram ou mesmo se o planeta vivenciava o mesmo período de bonança, na cabeça do apoiador ingênuo, vale o fato de que ele era o presidente nessa época. Some-se a isso a realidade do sujeito ser um excelente comunicador e está criado o mito da ‘pessoa certa’.

E quando as evidências de que o grande articulador do maior esquema de corrupção da história do Brasil era o Santo Homem? Que tal vê-lo condenado em segunda instância, com várias outras condenações a caminho? O que dizem seus devotos? Negam os fatos e fogem do assunto. Muitos devem se sentir constrangidos em perdoar seu ídolo, mas a emoção humilha a razão nesse caso: se ele é a pessoa certa, tudo bem estar fazendo a coisa errada.

Até que ponto deixamos nossos pré conceitos interferirem em nossas avaliações de temas do cotidiano? Somos bastante suscetíveis a essas indesejáveis contaminações. Afinal, quando necessário, devíamos focar nas ações e suas consequências, e não nas pessoas. Talvez essa afirmação nem chegue a ser um consenso. Muitos defenderão que é impossível dissociar o ato em si, da pessoa que o pratica. Isso dividiria o mundo entre bons e maus, no meu entendimento uma visão simplista e equivocada.

Dito isso, retorne às perguntas que abriram esse artigo. Como você reagiria?

5 Comments
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5 Comentários

  1. José Tosi

    2 de março de 2018 em 14:33

    Gostei da avaliação! No entanto, quero ponderar que a pessoa errada fazendo a coisa certa (no nosso caso, o Temer) não deveria interferir na minha percepção dele para o futuro. Probabilisticamente, uma pessoa errada faz uma coisa certa e muitas erradas!
    Assim como a percepção da maioria de que alguém é certo, não deveria ser suficiente para colocá-lo num pedestal. Nosso grande amigo Lula, não deu continuidade às mudanças estruturais que teriam nos colocado em um outro patamar econômico e, provavelmente, nem a Dilma conseguiria provocar a recente recessão.
    Mas, você tem razão, melhoraríamos muito nossas vidas se parássemos de pensar de forma tão linear. A vida é mais complexa do que isso e pessoas “certas” ou “erradas” produzem coisas “boas” ou “ruins”. Por isso, a necessidade de buscarmos uma identificação com os valores de cada vivente. Assim, passaremos a coincidir mais na avaliação do que é bom ou ruim.

    1. Victor

      3 de março de 2018 em 11:19

      Exatamente, Tosi. Mas acho que não temos essa percepção na maioria das pessoas, que acaba fazendo avaliações em cima de algo mais emocional / linear…

  2. Daisy Blanco

    3 de março de 2018 em 13:26

    Você está correto em suas colocações principalmente quando trazemos para o mundo corporativo onde as avaliações de desempenho dos integrantes de um mesmo time são emocionais, tendenciosas ou mesmo rasas permitindo o favorecimento de afetos e estagnar os desafetos… no entanto, entendo que para a política não funciona exatamente assim … opto por coloca los, a todos sem exceção, como farinha do mesmo saco… os conchavos que promovem as mudanças, aprovações e desaprovacoes das medidas políticas e economicas, são meras estratégias partidárias e nem sempre nos ajudam a entender com clateza as intencoes e ações por trás delas. No exemplo do Temer suas ações o colocam exatamente aí , a pessoa errada estando lá, aonde ele esteve por anos e aqui aonde ele permanece agora … quanto ao Lula foi a pessoa certa e fez o que se propos por um curto tempo … perdeu sua chance na humanidade e agora deve pagar pelo que fez com o país . A nós resta sabermos lutar para limpar a lambança de tantas pessoas editas como certas fazendo tanta coisa errada.

    1. Victor

      3 de março de 2018 em 14:39

      Perfeito, daisy. Sua observação sobre o mundo corporativo é bastante pertinente

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