Guia politicamente incorreto para sobrevivência na fauna do mundo corporativo

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Corporações nada mais são que agrupamentos de pessoas e por mais que exerçam influência sobre seus comportamentos a partir de uma cultura estabelecida ao longo de muito tempo, jamais conseguirão organizar a fauna praticamente ilimitada de espécies que transitam pelo seu mundo e que refletem a diversidade da natureza humana, com suas virtudes e fraquezas.

Cientistas sociais afirmam que é impossível catalogar todas as espécies existentes e que mutações genéticas tem ocorrido cada vez mais frequentemente, gerando animais exóticos e enriquecendo muito a fauna corporativa. Essa complexidade do ecossistema das organizações pode assustar os exploradores iniciantes, mas os animais geralmente não são perigosos. De qualquer maneira, todo cuidado é pouco. O guia abaixo apresenta um resumo das características das principais espécies conhecidas e pode ser complementado pelo leitor, pois estima-se que a variedade é maior do que a encontrada na biodiversidade da floresta amazônica.

fauna2Cachorro na árvore: Esse é facilmente identificável. Você sabe que ele só está lá por que alguém colocou. Não tem o menor traquejo para permanecer ali. Dessa forma, ou ele cai da árvore ou outra pessoa o tira de lá, é uma questão de tempo.

Alienígena: Esse ninguém sabe de onde veio. Boatos de que foi de outro planeta. Ao contrário do cachorro na árvore, o alienígena pode ser virtuoso. Seu problema é não conhecer absolutamente nada do ambiente ou trabalho em que se encontra. Seu destino varia; se for humilde suficiente para aprender sobre o novo mundo, conseguirá se adaptar, do contrário, inevitavelmente acaba despachado de volta ao seu lugar de origem.

Narciso: Se acha o máximo. É encontrado em todos os níveis organizacionais. Não enxerga ninguém à sua volta, trabalhar em sua equipe é um fardo. A melhor estratégia nesse caso é lhe passar um espelho e deixá-lo de lado, se admirando…

Ególatra: Não somente se acha o máximo, considera-se no nível imediatamente abaixo de Deus. Sua empáfia é insuportável. O pior é que muitas vezes posa de humilde, mas acaba demonstrando seu egocentrismo nos pequenos detalhes. Infelizmente é mais comum nos níveis mais altos da organização, fato que acaba contendo a vontade popular quase incontrolável de mandá-lo à merda.

Pau mandado: Também é encontrado a partir do nível gerencial. É incapaz de se posicionar com assertividade em qualquer assunto, obedece a opinião do chefe ou do grupo majoritário bovinamente, mesmo que ela seja indecente. Muitos se perguntam como um sujeito como esse chegou tão longe se comportando assim, mas essa talvez seja uma das razões para isso. Pode defenestrar a ideia que defendeu há poucas horas, se for da vontade do chefe.

PMDbista: Tem uma capacidade de adaptação extraordinária para surfar a onda do momento. Permanece sob os holofotes em diferentes gestões, não se intimida nem desanima com a mudança abrupta nos rumos ou estratégia da empresa, dança conforme a música. É considerado um essencial agente de transformação pelos líderes da empresa.

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Ligeirinho: Não consegue esperar para resolver um problema. Dispara e-mails como poucos, deliberando sobre as mais variadas questões e se utiliza do telefone em tempo real para eliminar as pendências. Por conta disso, pode deixar sua equipe em pânico e seus pares desesperados.  Apesar de ser geralmente efetivo, com a melhor das intenções pode se exceder em alguns e-mails e arrepender-se deles posteriormente. Devo admitir que eu carrego alguns genes dessa espécie.

Procrastinador: Está sempre arrumando desculpas para não finalizar um trabalho. Para ele, quanto mais tempo passar ‘ tocando bola no meio de campo’ , melhor. É mais comum em níveis gerenciais das funções de ‘ staff’  nas corporações multinacionais.

Fabricante de ppt: Esse coitado não trabalha, perde seu tempo com apresentações, mudando a fonte do gráfico, discutindo a cor do fundo da tela e outras perfumarias. O infeliz repassa o seu ppt com os diferentes chefes umas dez vezes. À noite, tem pesadelos onde perde a última versão com as alterações definitivas a poucos minutos antes da reunião, sempre muito importante.

Planilheiro: Sua vida é dentro de uma matriz multidimensional do ‘ MS Excel’  ou ‘MS Access’  ou similares. Ele simplesmente arrasa no manejo dessas ferramentas, mas estranhamente, não consegue manter uma conversação produtiva fora desse universo. Guarda na memória todos os ‘ links de fórmulas’, mas é incapaz de explicar o porquê de utilizá-las. Por outro lado, se for capaz de desenvolver essa aptidão em entender além do universo quadriculado das planilhas, tem grandes chances de crescer na organização.

Highlander: Esse é o sujeito que todos dão como morto, mas que renasce das cinzas com uma promoção inesperada. O mais estranho é que a espécie é capaz dessa proeza várias vezes ao longo da carreira. Trata-se de um dom quase sobrenatural.

Náufrago: Sabe aquele projeto lançado como a mais importante iniciativa da empresa, no qual todos querem trabalhar e que aos poucos vai perdendo vitalidade, até virar um mico? Pois bem, o tal projeto não é sacrificado por razões políticas e fica meio abandonado, no limbo, se convertendo quase em uma doença contagiosa, da qual todos querem distância. E quem está envolvido com ele nesse estágio? O náufrago.

Azarado: Essa espécie foi brindada com aquela característica única de atrair para si as iniciativas mais chatas da corporação. Pense em um abacaxi, uma atividade enfadonha, pouco desafiadora do ponto de vista intelectual e extremamente demandante do ponto de vista operacional….o azarado sempre está envolvido. Sempre! O sujeito nasceu no dia em que foi promulgada a Lei de Murphy!

fauna4Bloomberg: Se você quiser saber as últimas novidades sobre qualquer assunto na empresa, pergunte a ele (a). Essa espécie geralmente tem fontes quentes, mas às vezes espalha boatos. De qualquer maneira, todos na empresa recorrem a ela, sem exceção. Por conta da sua intensa conectividade com toda biodiversidade da corporação, às vezes é premeditadamente utilizado por outros animais, que o influenciam na propagação de notícias e geração de confusão. Por mais que possam gerar incêndios, sua presença é muito valorizada na floresta corporativa.

Eremita: É a antítese do Bloomberg. Vive absolutamente alheio às fofocas corporativas, a ponto de se surpreender com novidades que aconteceram meses antes e que estão mofando de tão velhas.

Centralizador: Normalmente é um gestor que nunca deixou de ser analista. Não sabe delegar, é inseguro e considera prioritário que absolutamente tudo passe por ele. Geralmente é um indivíduo de trato difícil.

Déspota: Ofusca a equipe, toma para si os louros dos êxitos e compartilha os fracassos. Julga-se um grande gestor, mas é detestado por seus funcionários, que ‘ puxam o carro’  na primeira oportunidade que surgir.

Hugo Chávez: Joga para platéia. Pouco conteúdo e muita lábia. Tem o dom de falar por horas sobre um assunto do qual não entende bolhufas e ainda parecer convincente. É um artista.

Jacaré: Trata-se de uma variação genética da espécie ‘ Hugo Chavez’ . Tem a boca grande e os braços pequenos. Em outras palavras, fala muito, mas trabalhar que é bom…

Peixe piloto: Está sempre acompanhando os tubarões. Se aproveita da ferocidade do predador e abocanha restos de comida. Os outros animais da fauna corporativa só não acabam com ele por que o tubarão está sempre nas cercanias. Sozinho, o peixe piloto não é ninguém, vira ‘ sushi’ .

Leitor de relatório: É uma espécie prima do planilheiro e do fabricante de ppt. Cientistas dizem que tem os mesmos antepassados. Pode ser identificado pela mesa, submersa em toneladas de papel. O sujeito parece nunca ter tempo para nada, a não ser debulhar-se sobre a papelada…dá pena.

Decisionfobia: O nome está grafado em inglês por se tratar de uma espécie muito comum nos ‘ headquarters’  de multinacionais. Normalmente são executivos muito bem posicionados que se ‘ borram’ de medo de tomar decisão, e por conta disso, quase nunca o fazem. E se forem colocados em uma situação na qual não resta alternativa senão se posicionar, é bom chamar um médico, pois o indivíduo pode ter um ataque neurológico fatal.

Vereador: Essa é uma espécie intrigante. Conhece todo mundo. E se for chamado para uma reunião em um outro andar, normalmente se atrasa, pois gasta minutos falando com todos com quem esbarra no caminho. Tem sempre um assunto pendente.

Burocrata profissional: Como o próprio nome diz, nasceu para criar todas as dificuldades do mundo e depois vender algumas facilidades. Não muitas, pois se ele facilitar muito, acaba perdendo o emprego, já que sua função corre o risco de tornar-se irrelevante.

Consultor frustrado: É o indivíduo que fica pajeando todas as empresas de consultoria que aparecem na corporação. O sujeito nutre uma paixão enrustida por planos de trabalho, cronogramas, ‘ follow-ups’ . Trata-se de uma espécie que é prima distante do burocrata profissional, só que mais sofisticado. Seu sonho era trabalhar na McKinsey.

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Profeta do apocalipse: Para esse sujeito, o mundo acabará amanhã, a estratégia está sempre errada, e a empresa flerta com a bancarrota. Pensa fazer o papel de ‘ advogado do diabo’ , mas no fundo é um chato de galocha.

Crente em duendes: Antítese do profeta. Para essa espécie, o céu está sempre azul, tudo se encaminha perfeitamente para o sucesso absoluto e não há a menor hipótese de que somente uma das cinco premissas absolutamente otimistas contidas no orçamento não vingue. Não é chato como o profeta, mas sua ingenuidade pueril incomoda na mesma intensidade.

Ilusionista: Capaz de criar cenários fantásticos sobre premissas absolutamente vulneráveis. Sua capacidade de comunicação é suficientemente boa para atrair a atenção das pessoas para o que lhe convém. Cedo ou tarde, a casa cai para o ilusionista, mas em muitas ocasiões, ele consegue começar tudo novamente em outras paragens.

Palhaço: Sempre de bem com a vida, alto astral, é uma presença muito agradável em qualquer ‘ happy hour’, mas costuma exagerar na dose de piadas durante reuniões sérias, podendo causar constrangimento e tomar ‘ invertidas’  públicas. Só que o palhaço não se emenda, é de sua natureza achar graça em tudo. Bom para ele, provavelmente vive mais leve.

Cara-fechada: É a antítese do palhaço. Nem uma convenção de humoristas consegue fazê-lo sorrir. Parece que sempre acorda escorregando em uma casca de banana. Esse é o último sujeito que você quer ver no happy hour. Mas isso não é motivo de preocupação, pois nem um guindaste é capaz de levá-lo até lá…

Amplificador: Espécie bastante perigosa, pois exagera em tudo. Tanto nas percepções sobre as boas notícias, quanto na avaliação das más notícias. Um gestor desavisado que dá ouvidos ao amplificador e toma decisões baseadas somente em suas opiniões, é capaz de fazer grandes lambanças e no final perceber que tudo não passou de tempestade em copo d’água. É muito importante identificar quem são os amplificadores da equipe, para evitar esse tipo de situação.

Chapa das secretárias: Às vezes o sujeito mal fala com o chefe, mas se dá muito bem com a sua assistente. Normalmente, vale-se dessa relação para obter informações relevantes. Cabe frisar que muitas vezes a relação de amizade é genuína. Evidentemente, também é útil. Geralmente, os (as) ‘ bloombergs’  também são chapas das secretárias.

Telefonista: Esse adora preencher sua agenda com conference calls. Muitas vezes, entra mudo e sai calado. Outras, intervém em raríssimas ocasiões, para marcar presença. Durante as chamadas, gosta mesmo é de navegar pela internet, usar seu ‘ipad’  e jogar ‘ candy crush’ . Em multinacionais, onde o esquema de incontáveis conference calls em língua estrangeira é frequente, ele coloca no ‘ speaker’  para que todos saibam que ele está ocupado com ‘ os gringos’.

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Filotabagista: Há 15 anos, era permitido fumar em ambientes fechados e dependendo da quantidade de fumantes no recinto, o ambiente de trabalho era inóspito, quase uma guerra velada entre fumantes e não fumantes. Felizmente, os primeiros foram definitivamente derrotados e hoje se quiserem dar vazão ao seu vício tem que se dirigir ao fumódromo da empresa, ou a um ambiente externo. Os fumantes, antes ‘ fashion’ , se tornaram quase párias. Mas tudo tem um lado positivo. O fumódromo converteu-se em ponto de encontro e  é incomum alguém ser criticado por dar uma escapada para fumar, mesmo que faça isso várias vezes ao dia. Como consequência desse contexto, muitos filotabagistas se tornaram vereadores. Não achou fulano no ramal? Deve estar fumando. Por conta disso, os fumantes também são mais bem informados que a média da população da empresa. Entre um trago e outro, muita notícia é compartilhada…

Nero: Adoram ver o circo pegar fogo. São observadores, e às vezes causadores, das grandes confusões da empresa. Amam um mal-entendido. Terminada a batalha campal, são eles que fomentam as versões que os ‘ bloombergs’ irão divulgar pela empresa.

UFC: Ao contrário dos Neros, que tocam fogo na casa e ficam contemplativos, a espécie UFC está na briga. Tem confusão na área? Essa espécie está presente.

Boca-aberta: Espécie muito devagar, move-se tão rápido quanto uma tartaruga nervosa. Se abrir a boca, com certeza entra mosca. Haja paciência.

Fazedores trogloditas: São extremamente competentes na execução de qualquer iniciativa, mas deixam um rastro de destruição por onde passam, devido à sua total inabilidade no relacionamento humano. Sei que é uma comparação extrema, mas eu prefiro um troglodita a um boca-aberta. É mais fácil cercar louco do que empurrar bobo…

Blablabla: Não conseguem ser objetivos. Somente o anúncio de que você terá uma reunião individual com essa espécie causa arrepios, pela certeza de que ela tomará mais tempo do que deve e o assunto não será resolvido…

Família-Empresa: Pensa que a empresa é a extensão de sua casa. Compartilha com gente que pouco conhece as novidades do cachorro, da empregada, a última receita da tia-avó e por aí vai. É do tipo que posta a todo momento mensagens bacanas sobre os colegas de trabalho no Facebook. Muitas vezes se decepciona, afinal, por mais que você goste do lugar onde trabalha, a empresa nunca será sua casa e seus colegas ou amigos do trabalho nunca serão sua família.

Árvore centenária: Esse está enraizado, não admite mudar o que faz há anos da mesma maneira. Fica extremamente contrariado em ambientes dinâmicos, com idéias novas ou mudanças. Para movê-lo de onde está, só com autorização do Ibama, o que pode uma eternidade…

Pegadores e periguetes: Esses pensam que a empresa é a extensão de suas camas. A função do local de trabalho parecer ser o fornecimento de novas conquistas sexuais. É mais comum nos mais jovens, gente com seus vinte e poucos anos, quando os hormônios estão mais descontrolados, mas casos são encontrados em todas as faixa-etárias. O mais interessante dessa espécie é que eles normalmente julgam que suas peripécias são mantidas sob sigilo. Quase nunca…

Plantadores de boatos: Trata-se de uma mutação genética da espécie ‘ Bloomberg’, com a diferença de que geralmente usa suas habilidades para o mal. Criador de teorias conspiratórias, factóides, disseminador de boataria. Considera que a empresa é um grande cortiço, com agiotas, prostíbulos, mafiosos. É uma maçã podre.

Sindicalista: Sempre acha que a empresa quer explorar os funcionários e qualquer decisão é premeditada para piorar a qualidade de vida das pessoas. É partidário do lema ‘ nós contra eles’, um desafio para qualquer gestor.

Atente para o fato de que foram listadas quase 50 espécies da fauna do mundo corporativo, tão complexa quanto a própria natureza humana. Isso sem contar as mutações, onde uma ou mais espécies se misturam. O sujeito acorda pela manhã para trabalhar sabendo que vai se embrenhar nessa selva, com todos os tipos de animais. Não dá para reclamar de falta de ‘ divertimento’ ….

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5 Comments
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5 Comentários

  1. sergio pereira

    3 de novembro de 2013 em 19:30

    Adorei esse texto…por alguma razao, nao tinha visto….posso copiar e postar na nossa pagina do facebook? nao a pessoal, a pagina MAPA

    abracao…..

    1. Victor

      3 de novembro de 2013 em 20:31

      Sergio, fique à vontade para compartilhar. Grande abs,

  2. Adri Alves

    5 de março de 2014 em 12:53

    Oi,

    Adorei seu texto.
    Estou compartilhando! 🙂

  3. s tosello

    29 de março de 2015 em 21:37

    Think you have covered the different types very well. Abracos,

  4. Rejane Rapanelli

    15 de outubro de 2017 em 07:39

    Muito bacana!

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