A era da superficialidade intolerante…ou da intolerância superficial

A quantidade ilimitada de informação disponível gratuitamente em tempo real tornou o mundo mais superficial, o que é um paradoxo. Ocorre que bombardeadas intensamente por todos os tipos de mídia, a maioria das pessoas não sabe selecionar os conteúdos e as fontes e ao invés de se aprofundar nos assuntos, consome breves ‘pílulas’ de notícias.

Para tornar a situação mais crítica, o dia a dia corrido e com menos tempo útil disponível estimula a preguiça: não são poucos os que se informam através de manchetes. E como há muito lixo circulante por aí, quem não é criterioso no acompanhamento das atualidades torna-se presa fácil ao jornalismo canalha.

A superficialidade é uma marca dos tempos atuais. Incrível, pois nunca a humanidade teve tanto acesso à informação.

Ao mesmo tempo, os quase 2 bilhões de usuários de redes sociais do planeta são estimulados a radicalizar sua posição sobre qualquer assunto. Protegidos pela ausência do contato físico ou visual, as pessoas perderam a cerimônia para destratar o próximo com o qual não concordam. É a falta de respeito elevada à máxima potência. Isso é obviamente um exagero, mas não seria tão absurdo imaginar o FB como um imenso octógno virtual, onde desconhecidos trocam sopapos verbais.

A intolerância também é uma marca dos tempos atuais. Para os radicais, discordar não é suficiente. É preciso ofender.

Sou testemunha desse ambiente pouco aprazível através das reações aos textos que publico em meu blog, compartilhado também nas redes sociais. Se por um lado, o mundo conectado deu voz a milhões de anônimos, como eu, que no exercício de um hobby podem manifestar publicamente sua opinião, por outro, também abriu as portas do inferno, permitindo comentários ofensivos e muitas vezes sem nenhum vínculo com a racionalidade.

O ato de entrar na ‘timeline’ de um desconhecido e ofendê-lo ou aos seus visitantes, é equivalente, no mundo real, a xingar seu anfitrão ou aos demais hóspedes durante uma visita. Convenhamos, um grande papelão, infelizmente tolerado nos códigos de conduta virtuais.

Não menos grave é o fato de que muitas vezes os leitores fazem juízo de valor de um texto a partir de sua manchete, sem o mínimo esforço para compreender seu conteúdo, muito embora em um país onde 92% dos adultos são incapazes de interpretar tabelas, gráficos e textos um pouco mais complexos, esse seja um comportamento tristemente previsível.

O nível de intolerância chega a tal ponto que as alas radicais de qualquer espectro ideológico cometem o desatino de buscar a proibição da manifestação de opiniões distintas das suas, situações verificadas recentemente quando grupos da esquerda fanática tentaram impedir à força a apresentação de um documentário sobre Olavo de Carvalho, um intelectual conservador, enquanto seus oponentes da direita radical tentaram fazer o mesmo com uma palestra de uma escritora estrangeira precursora da ideia de que gênero é uma invenção social.

Em um mundo civilizado, cidadãos podem expressar seus pensamentos livremente, e os incomodados poderiam discordar respeitosamente ou simplesmente ignorar os autores das ideias que lhe desagradam, sob a famosa doutrina do ‘cada um no seu quadrado’.

Mas geralmente não é esse o caso. A era da superficialidade intolerante produz burros nervosos em escala industrial. Resta-nos combatê-los com bom senso e temperança. Quem sabe assim eles não aprimorem seus modos e também a capacidade de interpretação de texto?

Enquanto esse dia não chega, a melhor maneira de permanecer imune à epidemia dos burrinhos nervosos é buscar a profundidade e disseminar o debate de qualidade. No longo prazo, a repetição desses hábitos proporcionará a supremacia da razão.

6 Comments
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6 Comentários

  1. Roberto Giangiardi

    11 de novembro de 2017 em 13:58

    Grande Victor!
    Belo texto, simples e ao mesmo tempo profundo, direto e verdadeiro!
    Abraços.

    1. Victor

      11 de novembro de 2017 em 14:40

      Valeu, Bob! Grande abs

  2. Doraci Antunes Leonel

    16 de novembro de 2017 em 09:54

    Está cansativo, já deixei a grande mídia há muito tempo, porém a net está se tornando igual, se não bastasse a troca de ofensas sem base alguma, há também blogueiros de má- fé e assim, tenho que ficar garimpando o que é real ou não.

  3. Luiz Afonso Costa de Medeiros

    11 de março de 2018 em 04:04

    Quando bárbaro vem ofender-me e a meus convidados em minha própria sala de visitas é rechaçado com civilidade, se insistir é denunciado e bloqueado. Não me dou ao luxo de descer ao patamar dos protozoários. Não entro na vibe deles! Ótimo texto caro Don Victor! Congrats! ??????

    1. Victor

      11 de março de 2018 em 10:31

      Obrigado Luiz! Abs

  4. rodrigo

    7 de julho de 2020 em 14:00

    Excelente texto! Infelizmente, muito (e cada vez mais) atual.

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